segunda-feira, 3 de maio de 2010

SILVIA, e suas conlusões sobre a terapia

Cinco horas da tarde, horário de Sílvia ir ao consultório, todas as quartas. A porta da sala de espera da psiquiatra se abre e entra Sílvia bastante triste, visivelmente abatida. Ela parecia não lavar o cabelo há semanas, o rosto não exibia nenhum traço de maquiagem. Como de costume a psiquiatra foi receber Sílvia, mas logo que viu a paciente naquele estado se apressou para dar as mãos e conduzi-la em um gesto amigo para dentro da sala de terapia.

Pergunta a dra. Maria Cristina: “ O que houve? Estou te achando abatida.”

Sílvia: “ Doutora eu resolvi tirar aquele homem da minha cabeça, eu pensei que ia ficar doida, mandava mensagens para ele quase diariamente no celular, às vezes ele respondia, às vezes não. Algumas vezes ele me disse que gostaria de “sair” comigo novamente pois eu era “gostosa". Mas doutora, “gostosa” de quê?”

A psiquiatra então disse: “Mas vcs se encontraram novamente?”

Sílvia: “Apenas duas vezes, aquela que contei a senhora, que nem valeu a pena, e outra vez, por acaso em um barzinho, mas dessa segunda vez a coisa pegou fogo.”

Cristina então pondera: “Sim? E vc gostou de estar com ele? Então foi bom".

Sílvia: “Nem sei dizer se foi bom, ele me deu bastante bebida. Em casa, na intimidade, notei que ele gostou muito. É...mas depois disso, nunca mais...."

E continua Cristina: “Doutora quase surtei de saudade, de aflição, de ansiedade e nada dele me ligar. Mandava mensagens e nada. Daí, ontem, eu encontrei uma pessoa que me falou sobre ele, que era frio e evitava compromissos. Mas o pior foi quando ela me que se queixava de certas "mulheres insistentes". “Ô doutora aquilo acabou comigo! Doeu tanto!”

Pensativa, Sílvia retorna a contar: “Aí eu pensei em salvar um pouco da minha dignidade e mandei uma mensagem para ele sobre o acontecido. Depois avisei que iria apagar o número dele da minha agenda.”

Cristina já curiosa: “E ele te respondeu, te tratou mal? Vcs discutiram? O que aconteceu?”

Sílvia: “Ele não respondeu. Então liguei e vi uma mensagem da telefônica informando que aquele número não existia mais."

Cristina, apoia a paciente com as mãos, perplexa: “O quê?”

Dra. Cristina olha o relógio, vendo que estava encerrado o horário da sessão diz com pesar: “Sílvia, como vc está sentido essa atitude dele, qual o significado disso pra vc? Podemos falar mais disso na próxima sessão”.

Sílvia: “Tudo bem doutora. Fiquei triste. Agora vejo que sinto também um certo alívio.”

Cristina: “Que bom! Que bom que vc está reagindo dessa forma, isso significa que vc está fechando esse ciclo de forma positiva e madura.”

A paciente, em meio a um sorriso sem graça, abraça a psiquiatra e diz: “Sabe doutora, penso que os homens deveriam mudar o número do telefone mais vezes.”

terça-feira, 9 de março de 2010

QUARTAS - SILVIA (parte 2)

Sílvia entra para sua habitual consulta às quartas. Mal a psicóloga abre a porta da sala Sílvia entra sorrindo e ofegante diz: -“boa tarde doutora, tenho novidades!”.

A médica então cumprimenta a cliente: -“boa tarde, como vai?”.

Recomeça a paciente: - “doutora Cristina eu tenho novidades. Bem, hoje fui a um evento no trabalho daquele rapaz com quem saí, lembra? Pois bem, na saída do auditório para sala de recepção ele estava na porta, mas passei rapidamente como se não o visse, pois ele não me ligou mais, assim, achei melhor não cumprimentá-lo. Depois, durante a recepção vi que ele vinha na minha direção, então entrei rapidamente no banheiro e me escondi. O que a senhora acha doutora? Acha que ele vinha na minha direção para falar comigo? O que a senhora acha que ele iria me dizer? O que a senhora acha que eu deveria ter respondido?

A médica olha pensativa para a paciente, respira fundo e diz: -“bem, não é possível responder a tantas hipóteses, só temos uma certeza, a de que ele saiu com vc, tinha seu número de telefone, e nunca mais ligou.”

A paciente então diz: -“sim doutora, disso eu sei, mas o que gostaria de saber da senhora, que consegue ler os pensamentos das pessoas, é se ele me viu, se ele vinha mesmo na minha direção, se ele vinha falar comigo e o que eu deveria ter respondido."

"Pulsos Sujos" (Maria Fernanda)

A angústia me consume desde o início da tarde, não sei o que fazer, qual o canto da casa ficar ou se sair, pra onde ir.

Saio, uma vontade de chorar, choro.

Vergonha da minha vergonha, vergonha da minha fraqueza inconfessável. Medo. Medo do que? Medo do acaso.

Mas sempre dominei esse acaso. Esse acaso tem sido cassado, arrancado, extirpado em todos os momentos. Tive lutas incessantes. Muralhas sangraram pelos meus pulsos, corajosamente segui em frente mesmo suada, cansada e suja de do líquido que move a vida, mesmo assim fui em frente.

Mas porque eu só agora vejo que preciso de um abraço? É que quero recarregar minhas forças, mas não sei como, nem sei mesmo como as perdi. Mas o demônio sabe! Ele percebe que os instantes de paz não tem sido suficientes para que eu me recomponha, e me procura pelos cantos e frestas. Eu me finjo de morta, mas ele sempre me acha e me apunhala sem piedade.

Assim, quase a beira da minha morte eu contenho meu último choro, poupo minhas poucas forças, e de repente para minha surpresa eu percebo o rosto de pavor do meu algoz, consigo ver - sem crer - o medo que ele tem mim. Ele também está assustado! Cansado e também sem forças, daí - simplesmente - me deixa e desiste!

Perplexos, ficamos eu e ele, sem saber quanto tempo ainda lutaríamos a até morte de um de nós.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Quartas - SILVIA (parte 1)


Quarta-feira, quatro horas da tarde, doutora Maria Cristina espera por Sílvia, abre a porta da ante-sala e lá está a paciente, paciente antiga. Silva tratava-se com a psicóloga há quase quatro anos. Ela é uma mulher comum, morena, estatura média, nem magra e nem gorda – no limite, cabelos escuros pouco abaixo dos ombros, possuidora de um jeito simples, educado e simpático.

Hora da terapia, doutora Maria Cristina chama a paciente para o sofá, ela senta, acomoda-se com uma almofada onde deita os antebraços, e então diz: “doutora sabe aquele rapaz que me convidava há meses para sair?”...bem, saímos na sexta passada, achei a conversa dele tão distante do meu mundo, mesmo assim, lhe dei uma oportunidade...fomos a um passeio em dos parques da cidades, mas lá encontramos alguns conhecidos dele, e o passeio que seria nosso primeiro encontro, se tornou mais um encontro coletivo de amigos, sendo que eu era a única do grupo de não falava a mesma língua.”

Então perguntou a psicóloga: “ o passeio não foi proveitoso?”.

Sílvia respondeu: “eu não sei! ... depois disso saímos a noite e não sei o que me deu e quando me dei por conta já estava no outro dia, dormimos juntos...eu nem me interessei por ele. Olha,.não sei porque fiz isso...mas o pior doutora não é isso, é que ele não me ligou mais, e hoje já é quarta-feira e sinto que ele não irá ligar...o que a a senhora acha?”

A psicóloga então diz: “mas nós já conversamos sobre isso, sobre como suas fantasias sobre os homens, sobre o amor, sobre as paixões, e tínhamos combinado que você teria um comportamento mais reservado, que não se colocaria vulnerável em relacionamento fantasioso, ou seja, em relações em que você não passa pelas etapas indispensáveis antes de se entregar ao seu parceiro. Mas... bem, estou vendo que, mais uma vez, você voltou ao círculo vicioso de um comportamento que não te permite ter a dimensão exata nem dos seus sentimentos, previsão até das suas reações, enfim...”

E Sílvia – aflita - retorna à psicóloga e pergunta: “sim doutora, eu já sei, já sei que faço tudo errado, mas me responda – pelo amor de Deus – a senhora que conhece tudo, que sabe de tudo, ele vai me ligar?”

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Maria Fernanda, comentários sobre um bom artigo


SOZINHO.COM (título da Revista Veja desta semana)

O que pode ser pior que os dias de domingo? Ninguém em casa, a sozinha.com não razão para acordar, nem a empregada vêm trabalhar neste dia, quem vai notar que ela não levantou para o café da manhã? Mas qual a razão de levantar? Para onde ir? Todos os “amigos” estão ali no computador, quer dizer nem tantos amigos assim, é que a sozinha.com resolveu, nos últimos tempos, ou nos últimos dois anos, resolveu mudar o foco para aplacar a solidão existencial, decidiu não investir mais em fazer amigos, mas procurar um relacionamento sério nos famosos sites de relacionamento. Bem, se não fosse trágico seria cômico, na verdade os dois, isso é quase sempre indissociável, como não ser ridículo e deprimente nas suas escolhas sem que dê azo às risadas afiadas das mentas amargas e reprimidas. Isso mesmo, “quem desdenha tem mesmo é a oculta vontade de “prevaricar”. Huumm..., este texto não é de um rodriguiano é que umas situações, bem banais, da miséria da vida afetiva moderna e comum, e desperta um pouco inconformismo a quem a retrata, faz nascer uma vontade para quem escreve (e se acha que não precisa de conselhos) um desejo de gritar:“Ei moça,MUDA!”;, “Ei, tenta outra coisa!”, “Puxa, sai daí!”, mas quem teria intimidade suficiente para dizer isso para alguém que só tem “amigos superficiais” e agora nem mais isso?

Bem, respondendo a pergunta da sozinha.com, pior que os dias de domingo só mesmo o Natal!

Quem sabe a sozinha.com tenha a mesma sorte que eu, leia uma revista legal e pense um pouco sobre isso!

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

VIOLENCIA DOMÉSTICA - Maria Cristina, terapia

separada há pouco tempo Andréia só pensava em recuperar o tempo perdido, recomeçar. Ela mesma costumava dizer que não era uma retomada, mas um real começo de vida no qual o passado lhe parecia ter sido uma história que aconteceu com outra pessoa. Aos 25 anos vestir uma roupa, que nem precisava ser nova, agora era um prazer. Descobrir traços de beleza ali, acolá, em vários lugares do seu corpo era como se nunca tivesse visto a si mesma.

De repente ela ouve batidas na porta. Frenéticas. Nem era preciso abrir para saber que era Marcos. Ela o atende de pé, ele entra sem convite, alterca frases de juras de amor em tom baixo e sofrido com gritos furiosos.

- Andréia, eu te amo, vc é tudo pra mim, não consigo dormir, não consigo trabalhar, vc me reduziu a nada, a vida não tem sentido sem vc ( Marcos em tom de choro).

- OLHA QUER SABER (fecha os punhos Marcos em direção ao rosto dela) AINDA SOU CASADO COM VC! NÃO VOU EMBORA! TUDO NESSA CASA TAMBÉM É MEU. NÃO VOU TE DAR PENSÃO PRA VC SAIR TREPANDO POR AÍ. OLHA, VC TÁ RIDÍCULA COM ESTA ROUPA, TODO MUNDO TÁ COMENTANDO TEU COMPORTAMENTO DE PUTA.

Seguem-se momentos tensos. Com a mão masculina e uma força brutal ela é jogada contra a parede. Enforcada ela não pode gritar. Sem ar ela sente a sensação de que os ossos e músculos estão sendo esmagados. Indignação, brutalizada covardemente ela percebe que segurança, proteção, confiança, foram palavras vazias quando se trata de violência doméstica.

Na sala da dra Maria Cristina, anos depois, em terapia, Andréia tenta relatar o significado de MEDO, tenta reproduzir sua insegurança. Impossível. O corredor negro que abriga esse sentimento no cérebro humano é povoado de monstros com faces e vozes indescritíveis. O MEDO não é um sentimento que ela experimenta somente ao se avizinhar uma possível e concreta nova agressão. O MEDO é um estado latente, é como um veneno que modifica a face de quem sente.
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quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Caixa de Memórias - Maria Teresa

Eu, criança, mantinha um diário mental, como esse blog, cheio de lembranças. Gostava de ter a idéia que minha mente era como se fosse uma caixa de guardados, nela ia deixando minhas recordações. Aos poucos , crescendo, fui percebendo que recordar não era o mesmo que reviver. Tentava voltar no breve passado, viver uma emoção repetidas vezes, esse era um dos meus hábitos preferidos.

Com algum tempo - ainda eu abrisse a caixa - vez por outra - os pensamentos e sentimentos assumiam cores cada vez mais apagadas e por vezes distorcidas. Um dia, já adulta, por algum motivo ou outro - tentei lembrar da sensação de solidão e liberdade que experimentava ao percorrer os caminhos que fazia para casa depois das aulas, tentei lembrar da independência de comprar com “meu” dinheiro o pão queijo ao sair da escola, – mas, por mais que forçasse a caixa imaginária não via mais meus guardados.

Percebi – sem que pudesse mudar isso - que a minha caixinha poderia até ser um cofre forte e seguro para guardar os meus queridos e/ou doloridos segredos, porém a chave do tempo nunca mais me permitiria abrir aquelas memórias. A garota da minha adolescência – real dona dos guardados - havia-se perdido para sempre, cresceu – tornou-se adulta - e levou consigo o real significado daqueles tempos.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Maria Fernanda, quero um pouco de espaço

Desde criança sempre quis ser notada. Notada significava dizer: como foi seu dia? Ter alguém com quem conversar, e compreenda-se por diálogo: falar e ouvir. Ao invés disso, sentia-me vigiada. Não me era perguntado o que eu sentia, nem o que eu vivia; quem queria saber de mim ia direto à fonte de toda minha privacidade, lia meu diário, espiava entre meus livros, minhas gavetas, meus guardados. Depois te tudo devassado, meus segredos se tornavam alvo de sujas especulações, eu não me sentia só invadida, mas deturpada em meus sentimentos ou às vezes simples pensamentos. Com o tempo percebi que ser invisível era a melhor política, esgueirar-me pelos cantos. A minha tristeza era sempre ignorada, nenhuma fonte de curiosidade ela motivava. Mas qualquer traço de pequena alegria era como uma pólvora que explodia aos olhos dos curiosos, e mais uma vez estava eu, sendo a atração, seguida das humilhações, e das decorrentes quebras dos sonhos recém construídos.

Porque não me deixam em paz? Sonhei tanto em envelhecer, em me tornar insignificante, imperceptível. Mas tinha sempre meu outro lado, que queria viver e ser feliz, enfim, livre. Seria isso possível?

Cidade pequena, calor intenso. Presa no carro com ou sem ar condicionado. Interna na sala do escritório. Nas ruas o calor castiga, impõe a solidão e recolhimento debaixo dos lugares mais frescos. Mesmo assim, quem não me nota? Rebelde eu sou, mas a ira dos curiosos e dos donos da vida alheia insiste em me atingir, bem no rosto, como o bafo de 40º. E sou forte, eu resisto, mas também sou fraca, me canso, e preciso do descanso, preciso ter forças para refazer meus sonhos, e protegê-los dos que insistem em minar minha alegria e entusiasmo.

Não quero em casa vigias, que me observem, percebam meus passos. EU SOU LIVRE! Se importem comigo ou ME DEIXEM EM PAZ! Deixe-me chorar. Deixem-me consolar com o pouco espaço que o sol escaldante e os “curiosos” não ocupam. Deixem-me neste pouco espaço de liberdade, que nesse momento, é o único que consigo ocupar. Por favor, não quero mais me esgueirar. Não me atormente com mais CULPAS, eu sei as minhas falhas, sofro fardo que elas representam.

Cresci, meu apartamento é pequeno, sem escadas para me esconder. Sobra-se o chuveiro, pois mesmo o quarto, ainda que fechado, parece que já foi descoberto, já sabem sobre minha cama, meus lençóis, meus travesseiros. Quando será que olharão o chuveiro?

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Maria Fernanda, crítica, mulheres de almas mortas

Final do expediente, a escrivã agendava os compromissos do dia seguinte da ocupada delegada. Ela Fernanda tinha um olhar pensativo, a sensação de que aquele dia se repetia, de que tinha atendido as mesmas queixas. Lembrava da última mulher que havia saído do seu gabinete, assim como da maior parte delas, vítimas contumazes. Elas até trocavam de parceiros, mas a estória se repetia, com cores semelhantes, as mesmas hostilidades verbais, estados alcoólicos freqüentes dos parceiros, traições reiteradas, enfim, todos os traços do desenho perfeito das relações afetivas caóticas.

“Como ensinar “essas mulheres” a serem amadas?” – tarefa difícil.

“Essas” eram mulheres marcadas pelo passado. Embaladas falsamente pela idéia de viver o presente, mas sem o sepultamento oficial dos amores idos. As “marias” brutalizadas não era submetidas a julgamento, mas condenadas pelas perdas dos sonhos.

Na verdade, os homens que tinham se tornado detentos por aqueles crimes haviam levado consigo o encarceramento dos próprios corpos mas as almas da mulheres que destruíram.
Maria Fernanda sabia que o amor não nasce, nem cresce, menos ainda habita ou faz casa em mulheres de almas mortas.

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Maria Fernanda, jogo do Brasil!!!

Como sempre Maria Fernanda chegava cedo nos lugares, mas não esperou muito e viu um amigo, com quem não tinha marcado nenhum compromisso, mas antes que as amigas chegassem sentou-se, sorriu e perguntou o trivial “tudo bem?”. O amigo, porém, respondeu: “não!”. Ela, meio confusa, não sabia ao certo se humor negro dele teria se dado pelo inusitado do encontro, e do provável incômodo de ter que, socialmente, conversar um pouco com ela. Mesmo assim, perguntou o motivo. O triste confidente, em mais uma surpresa, confessou que estava triste pelo fato de saber que sua recente ex-namorada já estava com outro.

(Fernanda, então, lembrou do passado, do dia em que acordou e havia pensado que ainda dormia. Dia inesquecível. Lembrou da mão sobre o travesseiro do lado contrário da cama, do lado que ele dormia. O pesadelo deste acordar nem era novo, repetia-se há dias. O cheiro masculino do amado nem podia ser mais percebido na cama, pois alguém, maldito alguém, havia, desavisado, trocado a roupa da cama. Nem precisava levantar e ir ao banheiro checar o resto das coisas, sabia que os únicos pertences que sobraram estavam ali mesmo, do lado da cama, dentro da gaveta. Os objetos da gaveta foram os únicos que sobraram, que ele deixou pelo simples fato de Fernanda garantiu a ele que após um acesso de raiva tinha jogado os objetos fora. Mentira! Eram fotografias deles, remédios que ele usava, pequenos pertences, pessoais, só dele. Na verdade, a Maria sequer teve coragem de ver, de perto, de abrir a gaveta e constatar o que sobrou, o que o sobrou talvez do único, único amor da vida inteira.)

De repente, Maria Fernanda despertou, e voltou a olhar para o amigo, tentando dizer alguma coisa coerente e solidária. “O que diria?

Mas logo chegaram suas amigas e um companheiro do seu triste confidente. O companheiro do então confidente, bastante eufórico, gritou: “cara, vamos logo, o jogo do Brasil vai começar!”. E subitamente o confidente sorriu, mudou de semblante, e como se fosse um novo homem, anunciou feliz e sem cerimônia para Fernanda: to indo, todas as quartas assisto as eliminatórias do Brasil!!!”.
...

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Maria Cristina, solidariedade

A porta de delegacia se abre: entra uma mulher magra e de estatura média, em vestido feminino e simples, com cabelos em desalinho, dirige-se ofegante até o balcão de atendimento.

Ela fala alto, nervosa e confusa não sabe ao certo a quem dizer e o que dizer, se a assistente social ou a escrevente. Maria Cristina, a mais nova das “marias” esperava a irmã, para carona do fim do dia, e em solidariedade a tanta aflição aproxima-se da estranha, estende-lhe as mãos e ampara a mulher. Com o rosto de lado, como se o pensamento ficasse mais denso em das duas partes do cérebro procura entender o que ela diz..

A desconhecida então coloca as mãos na face, cabisbaixa, em desespero, com a voz embargada diz: “vim confessar um crime, eu acho”... “deixei, agora a pouco, dois corpos sem vida, na minha cama, ali mesmo, onde os encontrei vivíssimos”...”mas confesso, a culpa que sinto não é da morte, ou das mortes, mas de não ter sabido antes, quando perdi, e se de fato perdi, naquela noite ou naquela cama, antes ou depois da morte, o amor daquele homem...”

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Maria Fernanda, "amigo é quem tem coragem pra ser"



Maria Fernanda, a mais velha das “marias irmãs”, diferentemente da beleza de Teresa, era uma mulher de estatura média, corpo roliço, dava a impressão de ser até um pouco gordinha. Sobrancelhas grossas lhe emprestavam um ar severo, as unhas ao natural confirmavam sua sobriedade.

Fernanda era Delegada de Polícia, não gostava de muita conversa. Trabalhava em uma Delegacia especializada para mulheres e todos os dias se deparava com vítimas das mais variadas formas de agressão, mas, naquele dia, em específico, presenciou algo que guardaria para o resto da vida.

Era 8:30 da noite e a sirene da delegacia soou alto – era um chamado de emergência, talvez com vítima fatal. A delegada resolveu ir, ela mesma, com o resto da guarda. Chegaram com algum tempo, o trânsito apesar da hora não facilitava o acesso. No local do crime, encontraram uma mulher de meia idade, um corpo já sem vida, metade sobre a rua sem asfalto e a outra metade sobre a calçada. Havia muito sangue nas mãos da vítima, estavam cortadas nas pontas dos dedos e nas palmas, como se tivesse tentando proteger o rosto ou o corpo antes dos golpes no tórax. Parecia um desses casos de brigas entre marido e mulher.

Perguntou a Delegada Fernanda se alguém poderia identificar o corpo. Ninguém respondeu.
Uma mulher ao longe olhava tudo com um pouco mais de curiosidade que o resto da multidão, o que chamou atenção da autoridade, e logo Fernanda tornou a perguntar, agora mais diretamente à mulher – “a senhora conhece a vítima."
A mulher respondeu – "não!" – "Conheço quem fez isso com ela."
Então a delegada indagou, de imediato, curiosa, quem teria sido.

"Meu marido" – respondeu a mulher. E continuou: "ele estava com raiva, bêbado, e como sempre ia me bater, então passou essa essa ..., e tentou me socorrer".
"Mas delegada..." – continuou a mulher , balançando a cabeça como um gesto de negação– "ele não ia me matar, ele ele tá acostumado só me bater... e eu, a apanhar."
"Sempre grito" – tornou a mulher – "mas nunca pensei que alguém pudesse me socorrer, e aí apareceu “essa, essa... doida” e entrou na frente."

"Como assim ? " – perguntou Fernanda. " A senhora está chamando uma pessoa que morreu por outra de "doida" ?"
"Essa mulher deu a vida pela senhora! Tenha respeito! " - Respondeu a delegada indignada.

“Morreu porque quis !” – disse a mulher. “Eu agora fiquei sem marido e pai dos meus filhos”. “ Ele não era nenhum assassino, só fez isso porquê ficou “puto” com essa “doida” que se meteu onde não devia."